segunda-feira, 19 de março de 2012

O Lundu, Uma Dança Afro brasileira!

O Lundu nasceu em Angola e Congo. Originalmente era uma dança trazida pelos escravos nos primeiros anos da escravidão.
A primeira referência escrita sobre esta dança data de 1780 – uma carta escrita por um antigo governador de Pernambuco ao Governo português, sobre danças de negros brasileiros denunciadas ao Tribunal de Inquisição. Nela o Lundu é descrito como dança de caráter licencioso e indecente, ferindo as normas da moral e dos bons costumes, passando a ser perseguido pelas autoridades.
O Lundu, depois disso, para que fosse preservado, aliou elementos musicais de origens branca e negra, tornando-se o primeiro gênero afro-brasileiro da canção popular. Realmente, essa interação de melodia e harmonia de inspiração européia com a rítmica africana se constituiria em um dos mais fascinantes aspectos da música brasileira.
Situado, pois nas raízes de formação dos gêneros afros, processos que culminaria com o advento do samba, o lundu foi originalmente uma dança sensual praticada por negros e mulatos em rodas de batuque, só se fixando como canção no final do século XVIII.
Em princípio, foi uma dança lúbrica e ardente dos negros, tendo depois, no século XIX, passado para os salões com feição brejeira, afinal se perdendo na transformação incessante de novas formas como o maxixe, o corta-jaca e a modinha.
O Lundu, cujo nome é oriundo do instrumento musical de percussão africano, é uma música alegre e buliçosa, de versos satíricos, maliciosos, variando bastante nos esquemas formais.
No Brasil é uma manifestação popular muito apreciada na Ilha de Marajó e em São Luís do Maranhão.

Coreografia:
A dança simboliza um convite que os homens fazem às mulheres "para um encontro de amor sexual". O "Lundu", considerado ao lado do "Maxixe ", uma dança altamente sensual, se desenvolve com movimentos ondulares de grande volúpia. No início as mulheres se negam a acompanhar os homens mas, depois de grande insistência, eles terminam conquistando as mulheres, com as quais saem do salão dando a idéia do encontro final. 

sexta-feira, 2 de março de 2012

Mulheres Guerreiras


                                                    “Candaces”
“Falar de Candace... É preciso olhar pra trás para ir pra frente. Porque atrás de nós tem um espelho e é nele que está nossa cara verdadeira. Nosso espelho é um espelho de Rainhas. Rainhas-Mães, Rainhas Guerreiras. Candaces. Somos herdeiros dessas Rainhas, temos a fala de nossos ancestrais”. (Trecho da peça Candaces – A Reconstrução do Fogo)
Candaces, dinastia de rainhas da África Oriental que comandaram, antes da era cristã, um dos mais prósperos impérios do continente. 
Mais do que uma linhagem de rainhas, Candace torna-se um conceito, através do qual a força da mulher negra se faz presente em lutas, conquistas e no legado matriarcal que venceu o tempo e as distâncias. 
As Mães Feiticeiras
Do grande continente africano trazemos não só a origem, mas também toda uma crença ancestral que exalta a figura feminina como a grande provedora que principiou a vida do Homem.
Um desses mitos conta que no início de tudo, ligadas às origens da Terra, havia as Mães Feiticeiras. Donas do destino da humanidade, elas eram o ventre do mundo. Conhecedoras dos segredos da vida. Continham em si a capacidade de manipular os opostos e, assim, manter o equilíbrio do universo. Traziam consigo a força criadora e criativa do planeta. Raízes de um misticismo que abrigava em sua sabedoria a dualidade do cosmos. Detinham o poder sobre a vida e a morte, o bem e o mal, o amor e a cólera, o princípio e o fim.
As Ascendentes Candaces 
Do mito à história, através do exemplo de duas grandes rainhas da Antigüidade, exaltamos o comando de mulheres negras sobre seus povos. Assim, evocamos a primeira ascendente Candace: Mekeda, ou Rainha de Sabá. Reino das mil fragrâncias, confluência das culturas árabe e africana. Sabá era uma terra rica e mantinha uma sociedade matrilinear, em que o poder era passado aos descendentes pela via feminina. Ali viveu a exuberante Rainha Negra. Atraída pela fama de riqueza e sabedoria que envolvia Salomão, o rei dos judeus, Mekeda adentrou Jerusalém com uma comitiva de camelos, levando uma infinidade de aromas e grande quantidade de ouro e pedras preciosas. Desse encontro nasceu a reverência à mulher que cativou com beleza, inteligência e diplomacia um dos soberanos mais importantes de sua época. 
Do Oriente, rumo ao império dos faraós, surge mais um exemplo do poder feminino negro. Nefertiti reinou no Egito por mais de uma década durante o apogeu de uma civilização que iria influenciar toda a humanidade. Reverenciada por sua beleza, governou ao lado de Amenófis IV (Akhenaton) com status equivalente ao dele. Juntos implementaram reformas culturais e religiosas, dentre elas o culto ao Deus Sol Aton. Foi imortalizada em templos mais do que qualquer outra rainha egípcia.
Candaces 
Ao sul do Egito, banhado pelo Nilo, havia o Império Meroe. Era governado por uma dinastia de soberanas negras que exerciam o poder civil e militar. Imortalizadas pela história como Candaces, estas bravas guerreiras nasceram sob o signo da coragem para ocupar posição de poder e prestígio. Numa forma de conexão com as tradições matriarcais da África, reinavam sobre seu povo por direito próprio, e não da qualidade de esposas. 
Viviam o apogeu de uma era de esplendor e fartura abençoados pelo grande rio, e impulsionadas pelo comércio com o Oriente Médio. A localização do império permitia um intenso intercâmbio com outros povos – hebreus, assírios, persas, gregos e indianos. Em suas terras, ricas em ferro e metais preciosos, ergueram-se pirâmides e fortalezas.
Seus exércitos usavam armas de ferro e cavalaria, ferramentas e habilidades herdadas dos povos núbios, que lhes davam vantagem no campo de batalha. A idolatria daquela civilização pelos cavalos era tanta que estes animais eram enterrados junto com seus guerreiros, para servi-los por toda a eternidade. Esta imagem, misto de homem e cavalo, alcançou a Grécia, inspirando o surgimento da figura mitológica do Centauro. Na religião, cultuavam Apedemek, Deus da guerra e da vitória, representado por um homem com cabeça de leão. 
A prosperidade de Meroe, que deu prosseguimento ao domínio Núbio na região, atraiu a ira dos senhores do mundo, o Império Romano. Aqui tem início o episódio que marcou a história das Candaces. 
Líderes de um movimento de resistência contra o poderio bélico dos invasores enfrentaram o forte exército, aliando técnicas de guerrilha e diplomacia. Uniram seu povo na luta contra o jugo romano movidas pela sede de justiça e liberdade. 
Após a invasão de Petronius, a Rainha Candace esperou que as tropas do general adormecessem e os surpreendeu com um ataque. Este movimento abriu a possibilidade para uma negociação diplomática, comandada pela soberana negra. O resultado foi a retirada dos soldados romanos e a demarcação do território de Meroe, devolvendo a paz ao seu povo. Assim foi escrito o mais importante episódio que marcou a nobre dinastia de guerreiras naquele império africano. 
Mas os exemplos de comando e resistência de bravas negras continuaram a florescer por outras eras e civilizações. Para além de seus próprios domínios, emergiu a saga das Candaces, Rainhas-Mães que se fizeram deusas, reinando na crença de suas descendentes espalhadas pela Terra, porta-vozes da sua luta por toda a história. 
As Descendentes 
Várias luas se ergueram e se puseram no céu do continente negro. Um dia, rainhas e princesas de tribos e reinos se viram obrigadas ao trabalho forçado no novo mundo. Mas foi ali que fizeram multiplicar o sangue Candace. Em uma terra tão distante, ligadas ao passado, mulheres negras geraram o valor da bravura herdade de suas ancestrais. 
A palavra liberdade ganhou um significado mítico no Brasil, dando um novo sentido à vida levada entre a clausura e o trabalho forçado. A bravura da dinastia Candace foi eternizada pela tradição oral africana, que tratou de espalhar aos quatro cantos os grandes feitos das suas soberanas, inspirando a luta de guerreiras que subverteram a força dos seus senhores e lutaram pela liberdade. Para elas, ser livre era também reverenciar seus costumes, reviver o passado soberano, encenar a memória dos seus antepassados. Em folguedos, foram eternizadas na glória real da corte negra. No novo continente, há o despertar para o misticismo trazido do outro lado do Atlântico. A construção da identidade africana no Brasil encontra nas celebrações e ritos toda uma reverência à mulher como mediadora entre os deuses e a humanidade.
Na Bahia, as escravas “ganhadeiras” vendiam o excedente de produção em feiras e mercados como em sua terra natal. O lucro era poupado para comprar suas alforrias e a dos maridos, tornando-as mulheres com voz ativa.
No chão brasileiro, era revivida a tradição das feiras iorubanas, um espaço não só para trocas de mercadorias, mas também para trocas simbólicas. A mulher concentrava o poder de fechar negócios, disseminar notícias, modas, receitas, músicas, e, sobretudo, aconselhar. Assim, tornaram-se as grandes mães negras, sacerdotisas que tiveram suprimido o poder real na África, mas que passaram a exercer o poder espiritual no novo mundo. 
Os elos entre arte e religião se tornaram mais fortes. As mães de santo se transformavam em mães de samba. Tia Ciata, a mais conhecida, era respeitada por sua sabedoria religiosa. Celebrava os orixás em cerimônias em sua própria casa, que sucediam festas regadas a muita música, batuques e quitutes. Um misto de consagração da música e dos deuses afro-brasileiros. 
Salve as Candaces do Candomblé, evocadas na saudação às entidades femininas. 
Odoyá, Iemanjá! Rainha das águas do mar;
Saluba, Nanã! Deusa da Terra;
Eparrei, Iansã! Senhora dos raios;
Orayê-yê o, Oxum! Guardiã da beleza e do amor;
Oba-xi, Obá! Senhora das águas revoltas.
 
Celebração de religião e do puro prazer de dar ao corpo o gingado malemolente, fruto da persistência destas rainhas, sacerdotisas, baianas, pastoras, mães negras do carnaval. 
A Imortalidade 
Mulher. Negra. Gênero e raça. São as Candaces dos nossos dias, herdeiras do laço afro e da missão de semear esperança na Terra. Provedoras da força que nos acompanha desde os primeiros passos. Detentoras do relicário da arte em prol do coletivo. 
Majestade, soberana, guardiã da sagrada chama da vida, dona do carnaval. Derrama teu talento ao interpretar a história da raça; enfeitiça os sentidos com tua beleza negra, libertando corpo e alma. Eleva-te ao panteon das matriarcas ancestrais da África e invoca a Candace dentro de ti. Resgata a força feminina das guerreiras imortais, Rainhas-Mães de todos os tempos, para abençoar e iluminar teus filhos, emanando o Axé, poder vital da bondade e do afeto, energia que comanda o mundo. 
Hoje, recontamos as glórias de quem um dia cumpriu seu destino e fez história, revivida sempre que alguém invocar teu nome. Salve as Candaces! Raça e gênero num só coração.

(Renato Lage, Márcia Lávia e Departamento Cultural do G. R. E. S. Acadêmicos do Salgueiro).  Ano 2007.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

VERDADE OU MENTIRA?


A Verdade e a Mentira num Conto Iorubá
 Lembro aqui uma lenda africana sobre a criação do mundo. Diz assim: Olofi, o Senhor que tudo criou – O bem e o mal, o bonito e o feio, o claro e o escuro, o grande e o pequeno, o cheio e o vazio, o alto e o baixo - , criou também a Verdade e a Mentira. Fez, no entanto, a Verdade forte, marcante, bela, luminosa, e fez a mentira fraca, feia, opaca. Ao ver assim a Mentira, deu a ela uma foice com a qual pudesse se defender. A Mentira sentiu inveja da Verdade e queria eliminá-la. Certa ocasião a Mentira se defrontou com a Verdade e a desacatou. Brigaram. Empunhando sua foice, a Mentira, com um golpe, degolou a Verdade. Esta, vendo-se sem cabeça, começou a procura-la tateando por volta. Apalpa um crânio que supõe ser seu. Com esforço agarra-o e o arrancando da onde estava, coloca-o sobre seu pescoço. Mas aquela era a cabeça da Mentira. Desde então, a Verdade anda por aí enganando toda gente. 

(cf. Dulce Mara Critelli, Ontologia do Cotidiano ou resgate do ser: poética heideggeriana. São Paulo: PUC – SP, Centro de estudos Fenomenológicos de São Paulo, 1984.) 



sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Só Para Relembrar...

E o samba?
Tia Ciata – Hilária Batista de Almeida (1854–1924)

 Hilária Batista de Almeida nasceu na Bahia em 1854. Aos 22 anos, mudou-se para o Rio de Janeiro, no êxodo que ficou conhecido como diáspora baiana. No Rio, formou nova família ao se casar com João Baptista da Silva, funcionário público com quem teve 14 filhos.
Como todas as baianas da época, era grande quituteira. Começou a trabalhar colocando o seu tabuleiro na Rua Sete de Setembro, sempre vestida de baiana. Com tino comercial, também alugava roupas típicas para o teatro e para o carnaval.
Mãe-de-santo respeitada, Hilária foi confirmada no santo como Ciata de Oxum, no terreiro de João Alabá, na Rua Barão de São Felix, onde também ficava a casa de Dom Obá II e o famoso cortiço Cabeça de Porco. Em sua casa, as festas eram famosas. Sempre celebrava seus orixás, sendo as festas de Cosme e Damião e de Nossa Senhora da Conceição as mais prestigiadas. Mas também promovia festas profanas, nas quais se destacavam as rodas de partido-alto. Era nessas rodas que se dançava o miudinho, uma forma de sambar de pés juntos, na qual Ciata era mestra.
A Praça Onze ganhou o apelido de Pequena África, porque era o ponto de encontro dos negros baianos e dos ex-escravos radicados nos morros próximos ao centro da cidade. Lá se reuniam músicos amadores e compositores anônimos. A casa de Tia Ciata, na rua Visconde de Itaúna 117, era a capital da Pequena África. Dos seus freqüentadores habituais, que incluíam Pixinguinha, Donga, Heitor dos Prazeres, João da Baiana, Sinhô e Mauro de Almeida, nasceu o samba. A música Pelo telefone foi o primeiro samba registrado, no final de 1916, e virou sucesso no carnaval de 1917.
As chamadas “tias” baianas tiveram um papel preponderante no cenário de surgimento do samba no Rio de Janeiro, no final do século XIX e início do XX. Além de transmissoras da cultura popular trazida da Bahia e sacerdotisas de cultos e ritos de tradição africana, eram grandes quituteiras e festeiras, reunindo em torno de si a comunidade que inundava de música e dança suas celebrações – as festas chegavam a durar dias seguidos. Nessa época, viviam Tia Amélia (mãe de Donga), Tia Prisciliana (mãe de João de Baiana), Tia Veridiana (mãe de Chico da Baiana) e Tia Mônica (mãe de Pendengo e Carmen do Xibuca). Mas a mais famosa de todas foi Tia Ciata, em cuja casa nasceu o samba.
Em 1935, o então prefeito do Rio, Pedro Ernesto, legalizou as escolas de samba e oficializou os desfiles de rua. Antes disso, sem horário nem percurso fixo, o indispensável era que os grupos passassem pela Praça Onze, pelas casas das “tias” baianas. Elas eram consideradas mães do samba e do carnaval dos pobres. A casa de Tia Ciata era parada obrigatória, pois era a mais famosa e muito respeitada pela comunidade. Até hoje, as tias são representadas e homenageadas nos desfiles, pela ala das baianas das escolas de samba.
Referências bibliográficas:
Moura, Roberto. Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro. FUNARTE, 1983
Cartilha Mulher Negra tem História, de Alzira Rufino, Nilza Iraci, Maria Rosa, 1987.
Oliveira, Eduardo (org). Quem é quem na negritude brasileira. São Paulo, Congresso nacional 1998.
Lopes, Nei. Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana. São Paulo, Selo Negro, 2004.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

LIBERDADE SERÁ?

“moço, não se esqueça que o negro também construiu, as riquezas do nosso brasil.”


100 ANOS DE LIBERDADE - REALIDADE OU ILUSÃO?


"Será.../ Que já raiou a liberdade/ Ou se foi tudo ilusão/ Será.../ Que a lei Áurea tão sonhada/ A tanto tempo imaginada/ Não foi o fim da escravidão/ Hoje dentro da realidade/ Onde está a liberdade/ Onde está que ninguém viu/ Moço.../ Não se esqueça que o negro também construiu,/ As riquezas do nosso Brasil./ Pergunte ao criador/ Quem pintou esta aquarela./ Livre do açoite da senzala,/ Preso na miséria da favela. Sonhei..../ Que Zumbi dos Palmares voltou/ A tristeza do negro acabou,/ Foi uma nova redenção./ Senhor../ Eis a luta do bem contra o mal,/ Que tanto sangue derramou,/ Contra o preconceito racial./ O negro samba,/ Negro joga capoeira,/ Ele é o rei na verde e rosa da Mangueira." (Hélio Turco, Jurandir e Alvinho)

Museu Nacional da Escravatura. "Um Lugar de Memória"



O Museu foi criado em sete de dezembro de 1977, aproveitando o edifício conhecido como a Capela do Morro da Cruz, construída na segunda metade do século XVIII. Foi residência do fidalgo português natural de Angola, Almirante das Naus Lusitanas para as Índias, Álvaro de Carvalho Matozo, (cavalheiro professo da Ordem de Cristo), filho de Pedro Matozo de Andrade, Capitão - mor dos presídios de Ambaca, Muxima e Masangano, um dos mais inveterados comerciantes de escravos. O edifício está classificado como Patrimônio Histórico Nacional pelo Ministério da Cultura através do Despacho nº 48 de 10 de novembro de 1993, consequentemente protegido pela Lei do Patrimônio Cultural.

O acervo é basicamente de imagens retratadas por pintores conhecidos como Debret, algumas constam em livros acadêmicos, como o "Ser escravo no Brasil" de Katia Mattoso. Possui também alguns objetos de torturas da época como: algemas, grilhetas, armas de fogo conhecidas como Kanyangulo, esferas usadas para impedir a fuga de escravos, cepo de madeira, flechas, mapas, gravuras, réplica das naus portuguesas e algumas esculturas.




O QUE O ATLÂNTICO UNIU, NINGUÉM IRÁ SEPARAR

O Brasil é um país extraordinariamente africanizado. E só a quem  não  conhece a África pode escapar quanto há de africano nos gestos, nas maneiras de ser e de viver e no sentimento  estético do brasileiro. Por sua vez, em toda outra  costa atlântica  podem-se facilmente  reconhecer os brasileirismos. Há comidas brasileiras na África, como há  comidas africanas no Brasil.  Danças, tradições, técnicas de trabalho, instrumentos de música, palavras e comportamentos sociais brasileiros insinuaram-se  no dia-a-dia africano. É comum que lá se ignore que certo prato ou determinado costume veio do Brasil. Como, entre nós, esquecemos  como nossa vida está impregnada de África. Na rua.  Na praça.  Na casa.  Na cidade.  No campo. O escravo ficou dentro de todos nós, qualquer que  seja  a  nossa  origem. Afinal, sem a escravidão o Brasil não existiria como hoje é,  não teria  sequer  ocupado  os  imensos  espaços que os portugueses lhe desenharam. Com ou sem remorsos, a escravidão é o processo mais longo e mais importante da nossa história. (Costa e Silva,1994)