O escritor e jornalista angolano, José Luís Mendonça escreveu um artigo para a Revista Austral, edição 89 da TAAG Linhas Aéreas de Angola, muito interessante. O texto faz referência à obra “Ilundo: Espíritos e Ritos Angolanos” de Óscar Ribas publicada originalmente em 1958. O artigo trata do culto tradicional das sociedades banto angolanas. José Luís Mendonça discorre sobre a influência dos espíritos na religião negra, e muito bem sustentado, fala sobre o sagrado e o profano e suas “manifestações das realidades sagradas”.
O
que seria então hierofania?
Segundo
o historiador de religiões e filósofo romeno Mircea Eliade, o termo é
dicotômico. Demonstra que é em torno da consciência da manifestação do sagrado
que se organiza o pensamento do homo religiosus. Este acredita em uma realidade absoluta, o sagrado, e desse fato
assume no mundo uma forma de existência específica.
O
sagrado manifesta-se sob diversas formas: ritos, mitos, símbolos, homens,
animais, plantas, etc.
Ele
manifesta-se qualitativamente de forma diferente do profano e chama-se
hierofania, a irrupção do sagrado por intermédio do mundo profano.
Eliade
considera que “O ocidental moderno experimenta certo mal estar diante de inúmeras
formas de manifestação do sagrado.” É natural temer o que não se conhece ou
questionar a cultura de quem pratica certas formas de crença. Ateus não creem
na existência de Deus. Para muitas pessoas não cristãs, Jesus Cristo foi um
homem comum e de forma alguma o santo filho de Deus. Em alguns ritos africanos
cultuam-se os rios, a terra, as plantas, o vento, a caça e muitas outras formas
e objetos. “É-lhe difícil aceitar que, para certos seres humanos, o sagrado
possa manifestar-se em pedras ou árvores, por exemplo,”. Mas, (...) não se
trata da veneração da pedra como pedra, de culto a árvore como árvore, são-no
justamente porque são hierofanias, porque “mostram” qualquer coisa que não é
pedra nem árvore, mas o sagrado, o <<ganz andere>> (ELIADE, 21).
Profano
é todo aquele objeto, pessoa, elemento da natureza que faz parte das coisas
comuns do nosso mundo. A manifestação de algo <<de ordem
diferente>> de uma realidade que não pertence ao nosso mundo natural
“profano” é então sobrenatural, portanto, hierofania.
Esse
é o ponto que Mendonça despertou em relação ao “Ilundo”. Óscar Ribas reúne em
sua obra um patrimônio único da oralidade africana, apontou sabedorias do “Quimbanda”,
um misto de médico e botânico, direcionado por espíritos.
Como
já se disse antes, a obra “Ilundo” trata das hierofanias da sociedade banto
angolana, apresentando nas suas manifestações espirituais, ou ideais, formada
pela cresça em, “Entes Sobrenaturais” e as suas manifestações naturais, ou
formas visíveis e palpáveis de expressar a sacralidade, que começam pela
presença dos “Ministros do culto”, chegando até os Ritos Diversos”. A obra tem
uma nota de ‘Esclarecimento’, uma ‘Introdução em um ‘Elucidário’ final,
constituindo no seu todo 205 páginas úteis.
Temos
vários exemplos de hierofanias em diversos cultos e religiões. O catolicismo
pratica a veneração aos santos e cultuam sua representação em imagens de gesso
ou esculpidas em madeira. Os fiéis afirmam ter recebido do santo, a realização
de um milagre. O reconhecimento desse milagre pela Igreja Católica, em seu
processo de canonização, faz do homem comum, um santo. A manifestação da fé
atribuída a esse homem agora santificado, consagrado, é uma forma de
hierofania.
O
protestantismo em suas várias denominações também tem suas hierofanias. As
Igrejas Pentecostais baseadas no livro de Atos dos Apóstolos, capítulo 2 da
Bíblia Sagrada, afirmam que seus membros manifestam o “Espírito Santo” ao falar
em ‘Línguas Estranhas’, prever o futuro pelo “Dom da Revelação de Deus” e fazer
movimentos estranhos com o corpo. Alguns chegam a imitar movimentos como o da
pomba, por ser o pássaro a representação do Espírito Santo, mencionado na
Bíblia.
A
própria Bíblia é uma hierofania. O livro reúne vários outros livros e
epístolas, denominados Evangelho. A Bíblia é um livro sagrado para o cristão,
pois nele está “A Palavra de Deus”. Para outros é apenas um livro histórico,
com alguns fatos não reconhecidos pela Arqueologia e pela própria História. O
que a torna sagrada é a crença que nela está “a palavra de deus”. O livro pelo
livro é natural, é “profano”.
Poderia
ainda falar sobre Judeus, Islâmicos, Ortodoxos, Hindus, Rituais Indígenas e
todos os outros cultos, porém o que importa para o ser humano é crer em algo ou
alguém. Cada pessoa tem a sua forma particular de encontrar o equilíbrio
interior e de se relacionar com o mundo espiritual.
Sabrina
de Oliveira
Revista
Austral, TAAG, edição 89, Jan. e Fev./2012.
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